Um estudo sobre a história da palavra leva-nos
naturalmente a questionar a sua origem: como surgiu? Em que época? Por que o
ser humano precisa da palavra? O que a palavra difere da comunicação animal? O
homem passou progressivamente do grunhido à articulação da palavra ou foi
dotado dela logo de início? Há dificuldade em responder a essas perguntas. As
pesquisas antropológicas pouca luz nos oferecem. O desconhecimento da origem
não nos impede de classificá-la em três estádios, de acordo com as condições sociais
vigentes: democracia, individualismo e recuo da violência.
A sociedade pré-histórica e o mundo primitivo
dão-nos algumas informações sobre o uso da palavra. O homo sapiens
sapiens, de 100 mil anos atrás, por exemplo, vivia da caça e da pesca, num
clima propício às geleiras. Em vista disso, surgiram os povos nômades que, uma
vez explorada uma região, partiam imediatamente para outra. Nesse estádio da
evolução, os "estilos gráficos" são apontados como uma das formas de
comunicação. Além disso, ao contrário da sociedade moderna, dominada pela
imagem, a palavra oral é a que mais se utilizava naquela época.
Em termos históricos, a sociedade grega da
Antiguidade oferece-nos as condições necessárias – a democracia –
para a verdadeira manifestação da palavra oral. Foi no regime democrático que
a téchne rhetoriké, a "arte de convencer", a
arte da manipulação da palavra como instrumento do "parecer"
desenvolveu-se rapidamente. Nesse regime, a palavra era um meio de igualdade
social, pois todos tinham o direito de expressar o seu pensamento. Daí, a
figura proeminente do sofista, o artífice da argumentação, que ensinava as
pessoas a bem conduzir uma discussão.
Na Idade Média, a democracia cede espaço ao
absolutismo. A religião tem um domínio amplo sobre todas as atividades,
inclusive as econômicas. É o regime feudal, em que as pessoas viviam isoladas,
fechadas em seus feudos. Os escolásticos abusavam da palavra, principalmente
pela disputatio. Posteriormente, surgiu a Renascença, fator
estimulador do individualismo – o segundo estádio do uso da
palavra. Nesse período, as Confissões de Santo Agostinho abre
caminho para a metáfora da interioridade: cada pessoa é única e a sua palavra,
também única, reflete a sua interioridade.
A característica das sociedades modernas é o recuo
da violência, o terceiro estádio do uso da palavra. A ênfase histórica é
dada às sociedades modernas, mas nada nos impede de observá-la ao longo do
tempo. Na tábua dos Dez Mandamentos, está implícito um verdadeiro combate à
violência. O "não matarás", o "não roubarás" e o "não
cobiçarás a mulher do próximo" são normas para coibir a violência da
época. Os regimes democráticos da atualidade propiciam, através da discussão de
seus legítimos representantes do povo, as condições necessárias para debelar a
violência que graça em todas as esferas sociais.
A palavra é força propulsora. Com ela podemos
dominar, aprisionar, matar, mas também libertar, enaltecer e fazer as pessoas
direcionarem os seus pensamentos para a verdade e o progresso de si mesmas.
Fonte de Consulta
BRETON, Philippe. Elogio da Palavra.
Tradução de Nicolas Nyimi Campanário. São Paulo: Loyola, 2006.
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