1. DISCURSO
Discurso - do
latim discursu(m) - significa ação de correr por ou para
várias partes. O termo comporta polivalência de sentido. Em oratória,
designa a elocução que visa comover e persuadir; na esfera dos estudos
linguísticos, representa a "sucessão coordenada de frases"; em
trabalhos de cunho científico, assume a denotação de "tratado",
"dissertação", como, por exemplo, o Discurso do Método de
Descartes; em filosofia, distingue-se o teor "discursivo"
do "intuitivo".
A estrutura
do discurso fundamenta-se no exórdio, na argumentação e
na peroração. Embora tenhamos muitas técnicas para bem iniciar e
terminar uma alocução, não resta dúvida que a argumentação é
sua trave mestra. Esta é a parte em que o indivíduo mostra o seu conhecimento,
a profundidade de seu pensamento. Para que haja comoção e persuasão, os
princípios elaborados devem ser lógicos e coerentes.
Expressamo-nos
através da palavra pensada, falada ou escrita. A sonoridade da
voz e a dicção perfeita auxiliam a propagação de nosso pensamento, porém o que
realmente conta é a essência daquilo que queremos transmitir.
Voz adocicada e gestos delicados podem, muitas vezes, encobrir o verdadeiro
caráter de um indivíduo. Contudo, se nos habituarmos a olhar criticamente,
teremos condições de separar o joio do trigo.
Operações
intermediárias encadeadas caracterizam o adjetivo
"discursivo" oposto a "intuitivo". Urge reconhecer que a
descoberta nas ciências e nas artes não segue uma sequência de operações
elementares parciais e sucessivas. Ela, muitas vezes, vem abruptamente. A
ordenação das ideias surge "a posteriori" como elemento para
tornar claro aquilo que se apreendeu de modo vago e obscuro.
O "discurso
do homem" é a manifestação da sua personalidade. Melhorando o teor de
nossos argumentos, mudaremos o conceito que os outros formam de nós. Leitura
metódica, estudo constante e reflexão frequente auxiliam sobremaneira a
aquisição de novos valores da vida. Sem esforço perseverante da vontade, nada
de útil conseguiremos amealhar em prol de nosso passivo intelectual.
Escolhamos com
critério os alimentos material e espiritual, a fim de que o nosso
"discurso" seja repleto de força, determinação e otimismo.
Fonte de Consulta
TRINGALE, D. Introdução à Retórica (a Retórica como Crítica
Literária). São Paulo, Livraria Duas Cidades, 1988.
&&&&&&&
2. ENUNCIAÇÃO
Ao enunciar um
discurso, o orador deve se preocupar tanto com o conteúdo a ser transmitido
quanto com a sua postura física e emocional. O discurso deve tender à
universalidade que, para atingir o seu fim, deve apagar as marcas da
particularidade, na qual está inserido o enunciador. Embora haja outros tipos
de enunciador, como o de identificação e o singularizado, o enunciador
universal é o que deve prevalecer.
Em se tratando do
enunciador universal, o uso da terceira pessoa é a mais aconselhável. E mesmo
que o orador use a primeira pessoa (eu), o teor da mensagem deve caminhar para
o universal. Opiniões são opiniões e não refletem a verdade dos fatos. Em
Espiritismo, que já tem um corpo doutrinário estabelecido, o "eu acho",
o "eu penso" e o "eu creio" deveriam ser rechaçados, e
usados somente como força de expressão, pois a convicção doutrinária
oferece-nos elementos substanciais para afirmações mais concretas.
Enunciação pressupõe
destinação. O destinatário também tem que ser universal. Não é recomendável que
o orador dirija-se a uma pessoa em particular. É possível que, durante a sua
exposição, separe pessoas e grupos, mas que fique apenas no campo do exemplo. A
universalidade significa um conhecimento abrangente, um conhecimento que tende
para a verdade, um conhecimento que capte os princípios fundamentais de uma
ciência, de uma filosofia, de uma religião.
O enunciador veio
para enunciar tal qual o semeador veio para semear. As palavras devem captar a
essência do que se pretende transmitir. Tudo, porém, deve passar pelo crivo da
razão e da lógica. Uma peça oratória confusa, cheia de impressões vazias, podem
mais atrapalhar do que ajudar na divulgação de uma ideia, de uma doutrina.
Nesse caso, um estudo mais aprofundado do tema é o recomendável.
A lei da expectativa
determina que o principal requisito para que determinadas coisas aconteçam é
acreditar que elas vão acontecer. Nesse caso, o enunciador, ao preparar o seu
discurso, deve se preocupar e até auxiliar na formação das expectativas do
público que vai ouvi-lo. Não adianta apenas a razão, a lógica e a boa
argumentação; para atrair, é preciso agradar. Este é o segredo daqueles que
falam em público e conseguem permanecer por longos e longos anos arrebatando as
plateias. Há oradores tão eloquentes que conseguem até arrancar lágrimas de
seus ouvintes. A divulgação dos princípios doutrinários do Espiritismo não
precisa chegar a esse ponto, mas um pouco de emoção é bem-vinda.
O enunciador deve
tender sempre para o universal, para o racional, para a verdade dos fatos, sem
esquecer o emocional. Somente assim conseguirá passar a sua mensagem com
mestria.
3. LÓGICA E DIALÉTICA
A filosofia tem o seu
universo, ou seja, o "universo do discurso". É uma argumentação de
ideias. Há sempre um perguntar. Não se pergunta por perguntar, mas para obter
uma resposta. Não qualquer resposta, porém uma resposta que aclare e explique.
A insatisfação da resposta gera novas perguntas, de tal modo que se amplie a
visão do tema estudado. Em linguagem mais simples: é um aprofundamento do
assunto tratado.
O orador deve ser
apto para falar sobre qualquer assunto e em qualquer lugar. Para tanto, deve
ter em mente as noções de lógica e de dialética. A lógica é a
condução correta do pensamento; a dialética, na boa visão de Hegel,
é o diálogo dos opostos. Quer dizer, à toda afirmação corresponde uma
contradição. Observe que geralmente aprendemos mais pelos erros do que pelos
acertos, tomamos mais consciência do bem através do mal do que pelo próprio
bem.
O fato de haver
pontos de vista opostos aos nossos não deve nos intimidar. Muito pelo
contrário, devemos, a cada passo, estimular ainda mais a confiança em nós
mesmos. Somos mais capazes do que imaginamos. A partir do momento que soubermos
fazer nexo com os fatos e com os acontecimentos, seremos capazes também de
discutir sobre qualquer assunto. Há, contudo, uma providência a tomar, ou seja,
verificar se tudo o que tencionamos saber faz realmente parte de nossa
programação de vida.
O estudo da lógica,
consistência do bem pensar, e a dialética, o elo de ligação entre a
refutação e a afirmação, encaminham o nosso pensamento para a vivência plena
das experiências. Esse modo de interpretar o real – o mundo que nos cerca,
municia-nos de uma ferramenta valiosa para a construção do nosso próprio
discurso, ou seja, um discurso elaborado a partir de nós mesmos, de nossas
limitações e potencialidades, no sentido de tudo expressarmos com as nossas
palavras e o nosso modo de ser.
A contradição, a
dúvida e o questionamento ajudam sobremaneira a veiculação do nosso pensamento.
Contudo, ao transmitirmos as nossas ideias, convém disciplinarmos as palavras
para que estas não causem confusão e insegurança naqueles que nos ouvem.
Faltando-nos a atenção e confiança do público, as nossas palavras caem no
vazio. Por isso, o esforço constante no trato com a palavra, tornando-a sempre
mais fluida, mais dócil e mais fácil de ser entendida.
Não nos preocupemos
com a pouca repercussão de nossos discursos. Importa que a semente seja bem
semeada, pois no seu devido tempo ela dará os seus frutos. A função do semeador
é semear e nada mais.
São Paulo, maio de
2006.
Nenhum comentário:
Postar um comentário